A linha, que se tornou tênue, entre o real e o virtual tem sido muito explorada há tempos. A maior parte das vezes as análises vêm repletas de críticas pejorativas no que se refere à relação entre homem e máquina. No entanto, esses mesmos analistas não vivem sem a escravidão de seus smartphones. Eis a ambivalência injustificável.
É evidente que os avanços, inclusive os tecnológicos (e não vou entrar no mérito etimológico acerca da téchne), apresenta-nos uma ampla melhora na qualidade de vida. Entretanto, o êxtase no qual a sociedade vive com seus novos aparatos eletrônicos transformou-a numa sociedade perturbada e doente. A doença a qual me refiro não vem, obviamente, somente através dos meios eletrônicos escravocratas, mas de coisas muito mais profundas que tomaram o pensamento contemporâneo, como a busca a qualquer custo pela tão sonhada felicidade, o que torna a pessoa carente e sensível em demasia, fazendo com que, a partir disso, ela, a pessoa, fica intolerante com as adversidades inerentes em quaisquer corpos sociais e relações. Para ser feliz na realidade do século XXI, é necessário, grosso modo, ter reconhecimento alheio, e para isso se faz necessário o “ter”, cujo verbo necessita do sangue daquele que o deseja. Nessa busca, contudo, o custo é o ônus da alma e da serenidade.
É muito comum, nos dias hoje, avistar-se pessoas que preferem cachorros a seres humanos (aqueles que pensam ser inteligentes optam por gatos); pessoas que preferem um animal de estimação a filhos; pessoas numa busca incansável pelo parceiro perfeito; pessoas, enfim, cada vez mais confusas e infelizes em sua trajetória atrás da tal felicidade.
Certamente, se esta fosse a época de Freud, este dedicaria alguns capítulos sobre essa estrada equivocada atrás da tão sonhada felicidade em sua obra Sobre a Psicopatologia da Vida Cotidiana.
O filme Her, de Spike Jonze, não chega a explorar a questão da felicidade em si (apesar de isto acabar sendo uma consequência do roteiro), mas explora o nível extremo em que o ser humano pode chegar na dependência de suas máquinas em detrimento de uma relação empírica e que requer virtudes cada vez menos vistas, como paciência, altruísmo, diálogo e hombridade. Apesar de Her ser um grande longa-metragem e de Jonze ser um grande diretor, nas mãos de gente como Polanski certamente o lado sombrio desse assunto teria sido mais bem enfatizado. (O filme é uma dica a ser procurada, já que enfatiza o assunto abordado. Não é a intenção deste artigo dissertar sobre ele.)
Não obstante, o objetivo do filme foi alcançado com sucesso, isto é, foram mostradas as faces reais do comportamento humano perante o arrebatamento a que ele é acometido pela tecnologia que ele próprio criou.
Diante da vida contemporânea conturbada, que é ditada apenas por conquistas e status, é comum adultos virarem crianças amedrontadas que querem colo, e sua preparação para o mundo real, que é carregado de sinuosidades, é desconstruída à medida que sua carência exacerbada aumenta. Assim, a sociedade fica despreparada para lidar com embates reais, como a adversidade, a contra-argumentação, as negativas e os enfrentamentos, e já que a relação humana é muito baseada nisso, a saída é comprar um bicho de estimação, que estará sempre pronto a somente obedecer e amar incondicionalmente.
quarta-feira, 26 de julho de 2017
quarta-feira, 24 de maio de 2017
Esgotamento Permanente
Uma manhã de segunda-feira; “Estou cansada”, ouço soar de uma senhora. Por alguns instantes refleti acerca do que acabara de ouvir. E voltei às minhas atividades.
Horas depois, ainda estava sendo perseguido por uma voz que me dizia “estou cansada”. E aprofundei minha reflexão sobre a questão.
Estaria ela cansada da vida? Ou sentia apenas aquele cansaço momentâneo que nos atinge a todos durante os dias da semana?
Penso que ela quis sugerir apenas um cansaço fugaz que certamente se esvairia durante o aquecimento do dia. Contudo, obviamente naquela frase estava implícita uma questão mais profunda, e que, decerto, penso eu, a própria senhora não se deu conta.
Por que nos sentimos cansados numa segunda-feira? Admitindo, claro, que o fim de semana tenha sido destinado, tecnicamente, ao repouso.
Pois bem, o que o mundo pós-moderno nos proporcionou, acima de tudo, foi melhor qualidade de vida, em praticamente todos os sentidos, em relação a tempos remotos. Inclino-me a pensar que mesmo um mendigo tende a viver “melhor” que os mendigos de tempos de outrora (perturbador, eu sei). Mas neste artigo não vou discutir sociologia, já que haveria de responder a questionamentos do tipo “você pensa que a qualidade de vida é boa, por exemplo, para o povo sírio?” A esta indagação indigna responderei. Penso que não. Mas também, grosso modo, não é boa para ninguém. Considerar algo bom ou ruim só é possível se propusermos um parâmetro. Talvez a Síria esteja melhor que no século XVI, quando invadida pelo Império Otomano; talvez esteja melhor que quando este mesmo império perdeu sua jurisdição para os impérios britânico e francês durante a Primeira Guerra Mundial. No fim, tudo é questão de referência. Adiante.
A melhor qualidade de vida da sociedade pós-moderna a que me refiro – e não vou entrar no mérito da solidez dessa qualidade, como fez Bauman, que tratou do assunto com maestria –, acarreta também um alto custo. Para mantê-la é necessário vender o sangue ao sistema que a alimenta. A busca interminável pela felicidade tem seu preço: sua alma.
Somos jogados, quase sem escolha, num ciclo vicioso e devastador que nos tira a paz física e mental. Tente fugir deste sistema! Se não for vencido sumariamente, entrará em algum outro sistema, provavelmente o da selva, que deverá ser ainda pior. Assim, por pior que seja o ciclo no qual nos encontramos, é ainda o menos pior dos ciclos.
Para compensar o sangue que vendemos ao sistema durante nossa semana, nos sentimos obrigados a “aproveitar” o fruto deste sangue no fim de semana, e fazemos o impossível para alcançar a tal felicidade nos momentos deleitosos de folga, já que a semana na labuta nos aprisiona, e já que a “felicidade” é uma meta que se busca a qualquer custo. Compras são feitas, shoppings são visitados, parques são usados para conforto..., enfim, mil programas. E ao abrir os olhos, o fim de semana, que era uma ilusão almejada desde a segunda-feira anterior, findou, e a segunda chegou novamente para mais cinco ou seis dias de sangue jorrado. No geral, fica claro o medo que as pessoas têm de ficar sozinhas e enfrentarem a si mesmas. Dessa forma, procuram movimentos ininterruptos. Não há mais paciência para o "ócio", não há paciência para um livro de quinhentas páginas, não há paciência para um filme de três horas, não há paciência para aprender a tocar um instrumento dignamente, não há paciência para o autoconhecimento...
Por que eu ouvi, numa segunda-feira de manhã, uma reclamação de cansaço? Penso que a resposta já foi dada. Independentemente de ter vindo ou não de uma senhora com idade mais avançada (isso foi obra do acaso), aquele cansaço atinge também os jovens, visto que eles, da mesma maneira, estão inseridos no mesmo ciclo vicioso, todavia, numa pessoa de mais idade essa roda gigante já deu exageradas voltas.
Eu entendo o cansaço daquela senhora. Não sei, no entanto, se o sinto na mesma intensidade, já que cada qual possui limites distintos. Qual é seu limite, leitor? O que faz, tendo ciência dos fatos, para alterar tudo isso, tendo o incômodo como princípio?
Caso vivêssemos num mundo onde se pudesse sempre dizer o que se pensa, eu teria dito àquela senhora: Não há saída. Desista! Mas o mundo não funcionaria se as pessoas sempre dissessem o que pensam. A omissão é umas das forças motrizes dessa roda gigante viciosa e escravocrata, assim como a necessidade de depósito de fé que o sistema precisa impor à sua busca pela felicidade a todo custo, haja vista que é somente através de esperança que um ser consciente (em se autodestruir, como se o tempo já não fosse nos dar este presente) produzirá energia suficiente para fazer com que nossa imensa roda gigante continue a circular, ad aeternum, sobre o mesmo eixo.
Horas depois, ainda estava sendo perseguido por uma voz que me dizia “estou cansada”. E aprofundei minha reflexão sobre a questão.
Estaria ela cansada da vida? Ou sentia apenas aquele cansaço momentâneo que nos atinge a todos durante os dias da semana?
Penso que ela quis sugerir apenas um cansaço fugaz que certamente se esvairia durante o aquecimento do dia. Contudo, obviamente naquela frase estava implícita uma questão mais profunda, e que, decerto, penso eu, a própria senhora não se deu conta.
Por que nos sentimos cansados numa segunda-feira? Admitindo, claro, que o fim de semana tenha sido destinado, tecnicamente, ao repouso.
Pois bem, o que o mundo pós-moderno nos proporcionou, acima de tudo, foi melhor qualidade de vida, em praticamente todos os sentidos, em relação a tempos remotos. Inclino-me a pensar que mesmo um mendigo tende a viver “melhor” que os mendigos de tempos de outrora (perturbador, eu sei). Mas neste artigo não vou discutir sociologia, já que haveria de responder a questionamentos do tipo “você pensa que a qualidade de vida é boa, por exemplo, para o povo sírio?” A esta indagação indigna responderei. Penso que não. Mas também, grosso modo, não é boa para ninguém. Considerar algo bom ou ruim só é possível se propusermos um parâmetro. Talvez a Síria esteja melhor que no século XVI, quando invadida pelo Império Otomano; talvez esteja melhor que quando este mesmo império perdeu sua jurisdição para os impérios britânico e francês durante a Primeira Guerra Mundial. No fim, tudo é questão de referência. Adiante.
A melhor qualidade de vida da sociedade pós-moderna a que me refiro – e não vou entrar no mérito da solidez dessa qualidade, como fez Bauman, que tratou do assunto com maestria –, acarreta também um alto custo. Para mantê-la é necessário vender o sangue ao sistema que a alimenta. A busca interminável pela felicidade tem seu preço: sua alma.
Somos jogados, quase sem escolha, num ciclo vicioso e devastador que nos tira a paz física e mental. Tente fugir deste sistema! Se não for vencido sumariamente, entrará em algum outro sistema, provavelmente o da selva, que deverá ser ainda pior. Assim, por pior que seja o ciclo no qual nos encontramos, é ainda o menos pior dos ciclos.
Para compensar o sangue que vendemos ao sistema durante nossa semana, nos sentimos obrigados a “aproveitar” o fruto deste sangue no fim de semana, e fazemos o impossível para alcançar a tal felicidade nos momentos deleitosos de folga, já que a semana na labuta nos aprisiona, e já que a “felicidade” é uma meta que se busca a qualquer custo. Compras são feitas, shoppings são visitados, parques são usados para conforto..., enfim, mil programas. E ao abrir os olhos, o fim de semana, que era uma ilusão almejada desde a segunda-feira anterior, findou, e a segunda chegou novamente para mais cinco ou seis dias de sangue jorrado. No geral, fica claro o medo que as pessoas têm de ficar sozinhas e enfrentarem a si mesmas. Dessa forma, procuram movimentos ininterruptos. Não há mais paciência para o "ócio", não há paciência para um livro de quinhentas páginas, não há paciência para um filme de três horas, não há paciência para aprender a tocar um instrumento dignamente, não há paciência para o autoconhecimento...
Por que eu ouvi, numa segunda-feira de manhã, uma reclamação de cansaço? Penso que a resposta já foi dada. Independentemente de ter vindo ou não de uma senhora com idade mais avançada (isso foi obra do acaso), aquele cansaço atinge também os jovens, visto que eles, da mesma maneira, estão inseridos no mesmo ciclo vicioso, todavia, numa pessoa de mais idade essa roda gigante já deu exageradas voltas.
Eu entendo o cansaço daquela senhora. Não sei, no entanto, se o sinto na mesma intensidade, já que cada qual possui limites distintos. Qual é seu limite, leitor? O que faz, tendo ciência dos fatos, para alterar tudo isso, tendo o incômodo como princípio?
Caso vivêssemos num mundo onde se pudesse sempre dizer o que se pensa, eu teria dito àquela senhora: Não há saída. Desista! Mas o mundo não funcionaria se as pessoas sempre dissessem o que pensam. A omissão é umas das forças motrizes dessa roda gigante viciosa e escravocrata, assim como a necessidade de depósito de fé que o sistema precisa impor à sua busca pela felicidade a todo custo, haja vista que é somente através de esperança que um ser consciente (em se autodestruir, como se o tempo já não fosse nos dar este presente) produzirá energia suficiente para fazer com que nossa imensa roda gigante continue a circular, ad aeternum, sobre o mesmo eixo.
domingo, 7 de maio de 2017
Amor: O Encosto dos Fracos
O amor sempre esteve associado à patologia, e, claramente, isto não mudou desde os tempos medievais, fase em que a literatura mais se ateve a estes assuntos. (Refiro-me aqui à relação conjugal.). Pathos: paixão, passagem, passividade, sofrimento.
Somos dependentes de outrem. No amor, as pessoas funcionam numa espécie de encantamento que tira o agente de si. Caso o amor não seja correspondido, o mundo acaba; por outro lado, se for, a dependência tende a aumentar, e seu mundo acaba da mesma maneira, visto que ele, seu mundo, torna-se o mundo do outro.
O mundo contemporâneo, através da genialidade de antepassados (e, claro, dos gênios também de nossas gerações, que poderão também ser chamados, num futuro, de “gênios de nossos antepassados”), proporcionou-nos uma vida mais prática, em comparação à vida de gerações passadas, entretanto, o que fizeram esses gênios se não destruir nosso mundo, à medida que esta praticidade nos fez mimados e carentes?
Na medida em que a média de vida humana aumenta (e está aí mais uma das genialidades humanas, mexer na própria mortalidade, ao passo que se consegue retardá-la), as pessoas não sabem o que fazer com tanto tempo, e destroem-se, e destroem-se umas às outras. É o ônus do ócio em demasia.
Fomos os escolhidos, à força do acaso, para viver a transição para esta realidade frenética. Ela mal começou, e já é possível notar as mentes cansadas, e querendo uma vida mais simples, como a dos antepassados, estes que nos deram (pensando que faziam o bem) esta vida insuportável.
As pessoas buscam uma vida mais singela, com menos vícios. A alimentação menos escravatória, o sedentarismo aos poucos sendo deixado de lado, bebidas e cigarros em menor intensidade... e o amor vivido em sua amplidão. Percebe, leitor?, a contradição que há nisso tudo? O maior dos vícios é superestimado, enquanto os demais são rechaçados.
Eu entendo, sim, que aquele que fala mal do amor é porque não passa de um fraco que se desiludiu em alguma medida. Contudo, a ilusão de uma vida perfeita, que é a busca da maioria, faz com que vivamos esta desilusão sem nos darmos conta de que ela nos acompanha no dia a dia. É a covardia vencendo a coragem às suas (suas, leitor) custas.
Veja que coisa linda. Uma moradia sendo paga em duzentos anos, com três filhos gritando pela casa e humilhando seus pais através de seus mimos, seis horas de trânsito num fim de semana para aproveitar uma praia lotada e fugir de uma realidade enquanto vive outra ainda pior...
A fuga de uma realidade X é a prova de que a vida que se foi escolhida não valeu a pena, e assim vamos nós fugindo das realidades que vamos escolhendo e vivendo.
Nossos avós, em termos gerais, viveram "felizes para sempre" porque não faziam parte de uma geração carente e mimada, ao menos não com a intensidade que vive nossa geração. (Falo, ainda, sobre relações conjugais. É óbvio que a qualidade de vida, segundo penso, melhorou através das gerações.)
"No fim valeu a pena?", perguntarão os apaixonados, num futuro. Suas respostas, se tomadas pelo devaneio e escravidão do amor, o que é bem provável, serão suspeitas.
Não escrevi este artigo, caro leitor, sugerindo que vivamos sozinhos para sempre, mas enquanto esta nova cultura do individualismo e carência em excesso não retroceder, o amor será apenas um encosto para os fracos.
Somos dependentes de outrem. No amor, as pessoas funcionam numa espécie de encantamento que tira o agente de si. Caso o amor não seja correspondido, o mundo acaba; por outro lado, se for, a dependência tende a aumentar, e seu mundo acaba da mesma maneira, visto que ele, seu mundo, torna-se o mundo do outro.
O mundo contemporâneo, através da genialidade de antepassados (e, claro, dos gênios também de nossas gerações, que poderão também ser chamados, num futuro, de “gênios de nossos antepassados”), proporcionou-nos uma vida mais prática, em comparação à vida de gerações passadas, entretanto, o que fizeram esses gênios se não destruir nosso mundo, à medida que esta praticidade nos fez mimados e carentes?
Na medida em que a média de vida humana aumenta (e está aí mais uma das genialidades humanas, mexer na própria mortalidade, ao passo que se consegue retardá-la), as pessoas não sabem o que fazer com tanto tempo, e destroem-se, e destroem-se umas às outras. É o ônus do ócio em demasia.
Fomos os escolhidos, à força do acaso, para viver a transição para esta realidade frenética. Ela mal começou, e já é possível notar as mentes cansadas, e querendo uma vida mais simples, como a dos antepassados, estes que nos deram (pensando que faziam o bem) esta vida insuportável.
As pessoas buscam uma vida mais singela, com menos vícios. A alimentação menos escravatória, o sedentarismo aos poucos sendo deixado de lado, bebidas e cigarros em menor intensidade... e o amor vivido em sua amplidão. Percebe, leitor?, a contradição que há nisso tudo? O maior dos vícios é superestimado, enquanto os demais são rechaçados.
Eu entendo, sim, que aquele que fala mal do amor é porque não passa de um fraco que se desiludiu em alguma medida. Contudo, a ilusão de uma vida perfeita, que é a busca da maioria, faz com que vivamos esta desilusão sem nos darmos conta de que ela nos acompanha no dia a dia. É a covardia vencendo a coragem às suas (suas, leitor) custas.
Veja que coisa linda. Uma moradia sendo paga em duzentos anos, com três filhos gritando pela casa e humilhando seus pais através de seus mimos, seis horas de trânsito num fim de semana para aproveitar uma praia lotada e fugir de uma realidade enquanto vive outra ainda pior...
A fuga de uma realidade X é a prova de que a vida que se foi escolhida não valeu a pena, e assim vamos nós fugindo das realidades que vamos escolhendo e vivendo.
Nossos avós, em termos gerais, viveram "felizes para sempre" porque não faziam parte de uma geração carente e mimada, ao menos não com a intensidade que vive nossa geração. (Falo, ainda, sobre relações conjugais. É óbvio que a qualidade de vida, segundo penso, melhorou através das gerações.)
"No fim valeu a pena?", perguntarão os apaixonados, num futuro. Suas respostas, se tomadas pelo devaneio e escravidão do amor, o que é bem provável, serão suspeitas.
Não escrevi este artigo, caro leitor, sugerindo que vivamos sozinhos para sempre, mas enquanto esta nova cultura do individualismo e carência em excesso não retroceder, o amor será apenas um encosto para os fracos.
domingo, 30 de abril de 2017
Banho de Sol
Assim somos nós a partir do momento da primeira abertura de olhos: covardes. Sem a consciência devida, assim permanecemos até um dia sairmos da escuridão, como alertou Platão. Nem todos saem, e desse modo vivem a sofrer as consequências da sobrevivência de forma menos dolorosa. E vivem como animais.
A consciência é o que nos diferencia dos demais seres que habitam esta terra. No fim, sabemos mais do que devemos e menos do que necessitamos, e isso apavora as mentes, já perturbadas, mundo afora.
Viemos parar aqui de forma acidental, e trazemos outros da mesma maneira, talvez por uma vingança inconsciente, talvez por um orgulho e mimo bobos de satisfazer nossos desejos.
A vida tem, sim, seus momentos de deleite, o que faz como que não ocorra um suicídio em massa. Contudo, esses momentos deleitosos seriam nada mais que um “presente” ilusório para nos manter presos onde estamos, já que é assim que o mundo funciona. Como seria este lugar caso fosse livre desses pecadores tontos escravizados pelo cotidiano?
Um presidiário possui algumas horas de sua penosa semana para refugiar-se frente ao sol que pouco vê. Seria essa uma decisão da lei para que ele não enlouqueça, não se mate, não mate a outros? “Tadinho”, pensam uns. “Morra!”, pensam outros. “Foda-se”, pensam terceiros, como eu. Entretanto, nossa vida não é muito diferente. Rejubilamo-nos nos parques, shoppings e praias (exceto eu), um dia da semana, para voltarmos vivos às nossas celas na segunda-feira seguinte. Os parques são nossos banhos de sol; nossa semana, nossa cela.
Religiosos são criticados por tentarem agir corretamente, segundo seus princípios, à espera de uma vida gloriosa futura. O que fazem esses críticos senão a mesma coisa? Ora, as pessoas, em grande parte das vezes, não deixam de agir contra seus instintos e vontades apenas para não sofrer as consequências das punições terrenas? A chance de ir parar numa prisão, por exemplo, caso ajam contra as leis, é bastante visível, mesmo que já fazem parte de uma prisão maior.
Religiosos, por outro lado, criticam os que não agem corretamente. E por que esperam um Salvador, já que são os próprios juízes?
Há sempre formas de tudo piorar, e há prisões dentro de prisões. Estamos interiorizados na prisão mor, dentro dela, há outras para aqueles que não agem de acordo com as regras impostas por esses prisioneiros primários; prisões e punições mais severas existem para aqueles que não agem de acordo com as regras da prisão secundária. E a prisão fim está instaurada na própria consciência humana, aquela consciência que nos faz ter ciência de que todos fazemos parte de uma prisão suprema. E tudo volta ao início do ciclo vicioso.
Aqueles, por fim, que estão presos apenas nessa prisão primária, que é o próprio mundo, sentem-se privilegiados, já que podem, diferentemente de outros presos, escolher como querem seu banho de sol.
A consciência é o que nos diferencia dos demais seres que habitam esta terra. No fim, sabemos mais do que devemos e menos do que necessitamos, e isso apavora as mentes, já perturbadas, mundo afora.
Viemos parar aqui de forma acidental, e trazemos outros da mesma maneira, talvez por uma vingança inconsciente, talvez por um orgulho e mimo bobos de satisfazer nossos desejos.
A vida tem, sim, seus momentos de deleite, o que faz como que não ocorra um suicídio em massa. Contudo, esses momentos deleitosos seriam nada mais que um “presente” ilusório para nos manter presos onde estamos, já que é assim que o mundo funciona. Como seria este lugar caso fosse livre desses pecadores tontos escravizados pelo cotidiano?
Um presidiário possui algumas horas de sua penosa semana para refugiar-se frente ao sol que pouco vê. Seria essa uma decisão da lei para que ele não enlouqueça, não se mate, não mate a outros? “Tadinho”, pensam uns. “Morra!”, pensam outros. “Foda-se”, pensam terceiros, como eu. Entretanto, nossa vida não é muito diferente. Rejubilamo-nos nos parques, shoppings e praias (exceto eu), um dia da semana, para voltarmos vivos às nossas celas na segunda-feira seguinte. Os parques são nossos banhos de sol; nossa semana, nossa cela.
Religiosos são criticados por tentarem agir corretamente, segundo seus princípios, à espera de uma vida gloriosa futura. O que fazem esses críticos senão a mesma coisa? Ora, as pessoas, em grande parte das vezes, não deixam de agir contra seus instintos e vontades apenas para não sofrer as consequências das punições terrenas? A chance de ir parar numa prisão, por exemplo, caso ajam contra as leis, é bastante visível, mesmo que já fazem parte de uma prisão maior.
Religiosos, por outro lado, criticam os que não agem corretamente. E por que esperam um Salvador, já que são os próprios juízes?
Há sempre formas de tudo piorar, e há prisões dentro de prisões. Estamos interiorizados na prisão mor, dentro dela, há outras para aqueles que não agem de acordo com as regras impostas por esses prisioneiros primários; prisões e punições mais severas existem para aqueles que não agem de acordo com as regras da prisão secundária. E a prisão fim está instaurada na própria consciência humana, aquela consciência que nos faz ter ciência de que todos fazemos parte de uma prisão suprema. E tudo volta ao início do ciclo vicioso.
Aqueles, por fim, que estão presos apenas nessa prisão primária, que é o próprio mundo, sentem-se privilegiados, já que podem, diferentemente de outros presos, escolher como querem seu banho de sol.
quarta-feira, 1 de março de 2017
A cartilha modinha para músicos toscos
Grande parte dos músicos que se autodenominam de esquerda tem uma concepção tosca sobre o que é música (e também sobre o que é esquerda), e de como os músicos devem agir ou escolher seus repertórios. Isso tudo está mais evidente em jovens do século XXI, apesar de muitos “tiozões” das antigas abraçarem a ideia. E é claro que a ideia tem sido amplamente difundida nas mentes alheias.
Se um compositor popular, na visão dessa corja, dedicar seu trabalho a músicas pop, será considerado grosseiro. Na concepção imbecil desses revolucionários de araque, um violonista popular, por exemplo, só deve tocar Chico Buarque e afins, e uma banda, só deve tocar alternativo (outro nome tosco).
Estamos numa era em que o músico digno tem de seguir uma cartilha: usar barba mulambenta; usar cabelo com rabo de cavalo (se for cacheado, melhor ainda); ser frágil (no caso dos homens), e, no caso das mulheres, ser vigorosa; cantar com voz mole, no estilo Marcelo Camelo – no caso masculino –, e, no caso feminino, com voz no estilo Malu Magalhães (no caso dos homens, ainda, cai bem usar uns falsetes); as músicas têm de, preferencialmente, ter cunho político criticando qualquer coisa (mesmo que não faça sentido), exceto governos que eles dizem ser do povo, povo este que eles odeiam, diga-se de passagem, e que olham do salto que fica em cima de suas coberturas instauradas em zonas confortáveis cidades afora. Ah, sim, as músicas também serão bem aceitas se pregarem o amor universal e um mundo sem guerras. Viva Imagine!
É o que nosso mundo pequeno tem criado, e que fica muito mais evidente na área cultural, já que esses “artistas” são chatos e barulhentos: uma sociedade medíocre, sensível, melindrosa e que não aceita o sofrimento, que é inato na espécie humana. A música é, então, nada mais que um espelho da sociedade que deixaremos para nossos rebentos.
Nota: Deixei de fora o mundo lixo do sertanejo, que merece uma coluna à parte.
Se um compositor popular, na visão dessa corja, dedicar seu trabalho a músicas pop, será considerado grosseiro. Na concepção imbecil desses revolucionários de araque, um violonista popular, por exemplo, só deve tocar Chico Buarque e afins, e uma banda, só deve tocar alternativo (outro nome tosco).
Estamos numa era em que o músico digno tem de seguir uma cartilha: usar barba mulambenta; usar cabelo com rabo de cavalo (se for cacheado, melhor ainda); ser frágil (no caso dos homens), e, no caso das mulheres, ser vigorosa; cantar com voz mole, no estilo Marcelo Camelo – no caso masculino –, e, no caso feminino, com voz no estilo Malu Magalhães (no caso dos homens, ainda, cai bem usar uns falsetes); as músicas têm de, preferencialmente, ter cunho político criticando qualquer coisa (mesmo que não faça sentido), exceto governos que eles dizem ser do povo, povo este que eles odeiam, diga-se de passagem, e que olham do salto que fica em cima de suas coberturas instauradas em zonas confortáveis cidades afora. Ah, sim, as músicas também serão bem aceitas se pregarem o amor universal e um mundo sem guerras. Viva Imagine!
É o que nosso mundo pequeno tem criado, e que fica muito mais evidente na área cultural, já que esses “artistas” são chatos e barulhentos: uma sociedade medíocre, sensível, melindrosa e que não aceita o sofrimento, que é inato na espécie humana. A música é, então, nada mais que um espelho da sociedade que deixaremos para nossos rebentos.
Nota: Deixei de fora o mundo lixo do sertanejo, que merece uma coluna à parte.
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017
O comportamento do casal contemporâneo
É interessante pensar como funciona, na contemporaneidade, um relacionamento entre casal.
No amor contemporâneo, não pode haver ciúme, isto seria falta de confiança, motivo este suficiente para um rompimento.
No amor contemporâneo, não se pode duvidar do outro, seria, mais uma vez, falta de confiança.
No amor contemporâneo, não se pode dizer “não”, isto seria falta de apoio.
A sensibilidade exacerbada destrói casais. As pessoas, no decorrer dos anos, se enfraqueceram diante da vida. A rotina é muito frenética, é preciso sempre provar ser o melhor para poder sobreviver e para não ficar para trás. Tudo isso faz com que o mundo real crie pessoas fortes externamente, mas fracas espiritualmente. À medida que se conhece a intimidade das pessoas, elas abrem a porta de seu armário, e de lá sai toda a fraqueza e sensibilidade escondidas por detrás de um mundo que consome. E quem sofre com isso não é o chefe do trabalho, mas o parceiro da vida.
O mundo contemporâneo, através de todo o mercado consumidor, também criou pessoas mimadas e que demoram mais tempo para amadurecer, tendo como parâmetro as gerações passadas. E isto faz com que um simples “não” se torne uma briga épica.
No mundo contemporâneo, a realização dos desejos vem em primeiro lugar. Portanto, se o parceiro não aceitar a proposta do outro, significará falta de amor, de sensibilidade, de apoio e de companheirismo.
Quem não sentiria ciúme, por exemplo, de ouvir do namorado (a) que este sairá com uma amiga (o)? Esse mundo alternativo e liberal, neste nível, ainda é muito pequeno, quase inexistente. Mas no amor contemporâneo, este ciúme é inadmissível, significaria, mais uma vez, a falta da bendita confiança.
Quando se ama, não se deseja a felicidade do outro a qualquer custo, mas se deseja a felicidade do outro a seu lado.
A maior fraqueza contemporânea talvez não seja o risco de fracasso no trabalho, nem o desprezo dos amigos que vão ficando pelo passado, mas, sim, passar a vida fingindo que não sente ciúme, fingindo que confia no próximo, passar a vida dizendo “sim” para não passar a imagem de alguém que não é companheiro, passar a vida, por fim, enganando o próprio coração para fazer alguém feliz.
As pessoas têm medo de ser humanas, querem ser apenas uma máquina de agradar (mas agradar a sociedade), e isto as destrói. Não quero dizer com tudo isso que não se deva, para uma melhor vivência, lutar contra desejos maléficos, como o de querer exercer poder sobre alguém, mas apenas de que fingir que esses desejos não existem é lutar contra si mesmo.
No amor contemporâneo, não pode haver ciúme, isto seria falta de confiança, motivo este suficiente para um rompimento.
No amor contemporâneo, não se pode duvidar do outro, seria, mais uma vez, falta de confiança.
No amor contemporâneo, não se pode dizer “não”, isto seria falta de apoio.
A sensibilidade exacerbada destrói casais. As pessoas, no decorrer dos anos, se enfraqueceram diante da vida. A rotina é muito frenética, é preciso sempre provar ser o melhor para poder sobreviver e para não ficar para trás. Tudo isso faz com que o mundo real crie pessoas fortes externamente, mas fracas espiritualmente. À medida que se conhece a intimidade das pessoas, elas abrem a porta de seu armário, e de lá sai toda a fraqueza e sensibilidade escondidas por detrás de um mundo que consome. E quem sofre com isso não é o chefe do trabalho, mas o parceiro da vida.
O mundo contemporâneo, através de todo o mercado consumidor, também criou pessoas mimadas e que demoram mais tempo para amadurecer, tendo como parâmetro as gerações passadas. E isto faz com que um simples “não” se torne uma briga épica.
No mundo contemporâneo, a realização dos desejos vem em primeiro lugar. Portanto, se o parceiro não aceitar a proposta do outro, significará falta de amor, de sensibilidade, de apoio e de companheirismo.
Quem não sentiria ciúme, por exemplo, de ouvir do namorado (a) que este sairá com uma amiga (o)? Esse mundo alternativo e liberal, neste nível, ainda é muito pequeno, quase inexistente. Mas no amor contemporâneo, este ciúme é inadmissível, significaria, mais uma vez, a falta da bendita confiança.
Quando se ama, não se deseja a felicidade do outro a qualquer custo, mas se deseja a felicidade do outro a seu lado.
A maior fraqueza contemporânea talvez não seja o risco de fracasso no trabalho, nem o desprezo dos amigos que vão ficando pelo passado, mas, sim, passar a vida fingindo que não sente ciúme, fingindo que confia no próximo, passar a vida dizendo “sim” para não passar a imagem de alguém que não é companheiro, passar a vida, por fim, enganando o próprio coração para fazer alguém feliz.
As pessoas têm medo de ser humanas, querem ser apenas uma máquina de agradar (mas agradar a sociedade), e isto as destrói. Não quero dizer com tudo isso que não se deva, para uma melhor vivência, lutar contra desejos maléficos, como o de querer exercer poder sobre alguém, mas apenas de que fingir que esses desejos não existem é lutar contra si mesmo.
A hipocrisia brasileira na era Trump
Trump renegou o acordo do Transpacífico, assim como Dilma renegou a ALCA, aqui nas Américas; Trump coibiu, temporariamente, a entrada de imigrantes de alguns países (islâmicos, por causa de terrorismo, e hispânicos, por causa de droga), assim como o Brasil fez, de forma genérica, com a Lei do Estrangeiro, de 1981, lei esta somente abolida com a nova Lei da Imigração (2016), criada por Aloysio Nunes (PSDB).
Nota 1: O México também tem suas fronteiras fechadas para os centro-americanos, mas reclamam dos EUA.
Petistas e afins (e agora toda a sociedade), ensandecidos com as medidas de Trump, não percebem que durante os mandatos Lula/Dilma fazia-se a mesma coisa no Brasil, tanto com os imigrantes, como com acordos internacionais.
O Brasil também já usufruiu de trabalho escravo; O Brasil também já tomou territórios; o Brasil perseguiu imigrantes clandestinos até pouco tempo; o Brasil também já massacrou em guerras.
Portanto, cuidado com alguns julgamentos.
E não, não votaria, se fosse o caso, em Trump, mas tampouco votaria em Hilary Clinton, adversária de Trump nas últimas eleições; brasileiros imaturos imaginam que os democratas são de esquerda. Pura inocência.
Não aprovo a maior parte das medidas de Trump, outras, como a de proibir financiamento a grupos pró-aborto, sim, mas minha intenção neste artigo é apenas apontar algumas hipocrisias por parte de pessoas que querem ter sua imagem bem aceita perante as redes sociais. Ser contra o Trump hoje em dia é como ser vegano ou andar de “bike”: faz bem para a imagem. A isso também sou contra!
Nota 2: Diga "bicicleta", e não "bike"!
Nota 1: O México também tem suas fronteiras fechadas para os centro-americanos, mas reclamam dos EUA.
Petistas e afins (e agora toda a sociedade), ensandecidos com as medidas de Trump, não percebem que durante os mandatos Lula/Dilma fazia-se a mesma coisa no Brasil, tanto com os imigrantes, como com acordos internacionais.
O Brasil também já usufruiu de trabalho escravo; O Brasil também já tomou territórios; o Brasil perseguiu imigrantes clandestinos até pouco tempo; o Brasil também já massacrou em guerras.
Portanto, cuidado com alguns julgamentos.
E não, não votaria, se fosse o caso, em Trump, mas tampouco votaria em Hilary Clinton, adversária de Trump nas últimas eleições; brasileiros imaturos imaginam que os democratas são de esquerda. Pura inocência.
Não aprovo a maior parte das medidas de Trump, outras, como a de proibir financiamento a grupos pró-aborto, sim, mas minha intenção neste artigo é apenas apontar algumas hipocrisias por parte de pessoas que querem ter sua imagem bem aceita perante as redes sociais. Ser contra o Trump hoje em dia é como ser vegano ou andar de “bike”: faz bem para a imagem. A isso também sou contra!
Nota 2: Diga "bicicleta", e não "bike"!
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