sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

A água além de SP

De certa forma, é um tanto difícil escrever o que irei escrever, pois a maior parte do que hei de expor aqui vai na contramão do que é noticiado. Mas vamos lá.

É consenso, sim, que vivemos uma dificuldade no campo hídrico. Praticamente, inclusive, o mundo todo o vive. A China, por exemplo, secou o Rio Amarelo. Nos EUA, não cessam brigas jurídicas em decorrência da seca. O Texas processa o Novo México e o Colorado pelo uso da água do Rio Grande, o qual passa pelos três Estados. A Califórnia é o Estado mais castigado pela seca no país, e algumas cidades já adotaram racionamento. Os ingleses estão atravessando a pior seca do século, e em momentos assim, moradores que desperdiçam água, como, por exemplo, através do uso de mangueiras, podem receber multas que ultrapassam os quatro mil reais. O Brasil possui, em toda sua extensão, aproximadamente 1200 municípios com problemas de abastecimento de água.

Tive de fazer esse pequeno prólogo para deixar claro que o problema da escassez de água não é só do Estado de São Paulo, como desejariam os petistas e afins. Mas as críticas sobre o governador do maior Estado do país não cessam, e o mais indecoroso é que tais críticas são direcionadas somente a ele. É claro que o terrorismo possui intenções políticas. Nem gosto muito do termo “falta de água”, pois essa “falta”, a qual tantos se referem, não existe. Desde que o assunto virou moda, não houve, por exemplo, nenhum período em que se passou um mês sem chuva. O que existe é uma escassez, o que, é claro, não torna o problema menos grave. Falta de água foi o que houve em 1969, ano este em que ficou aproximadamente seis meses sem chuva na cidade de São Paulo. Nesta época, porém, a cidade ainda não era coberta por asfalto, e o solo, em épocas de chuva, fazia o trabalho de armazená-la, por isso, onde se cavava achava-se água em demasia. Hoje, nem ao menos é salutar tentar retirar água do solo, pois a pouca água que existe há de estar contaminada, em decorrência de tantas e tantas indústrias que se instalaram na cidade nas últimas décadas.

Há dois anos, ninguém falava sobre falta de água, nem tampouco do nível de represas como a Cantareira. Não falavam porque não havia risco de escassez; todas as represas estavam funcionando bem. Hoje, que o problema está à mesa, noticia-se que há mais de dez anos o problema era visível, e que o governo nunca se importou. Mentira! Infelizmente, as raras chuvas pegaram todos com certa surpresa, inclusive o governo federal. De 2011 para cá, houve mais de 240 apagões em decorrência de problemas de abastecimento nas hidrelétricas e também má gestão na área. Mas as críticas recaem somente sobre São Paulo.

A Sabesp nunca parou de fazer obras em São Paulo, como, por exemplo, desvio do rio de Piracicaba. Acreditar que São Paulo sobreviveria todos esses anos sem obras hídricas é mais que uma cretinice, é burrice.

Quase que diariamente, é noticiado que em São Paulo há 37% de vazamento de água. Não podemos discordar, mas o que não se noticia, é que desses 37%, um percentual que, com certeza, ultrapassa os 20%, é só de instalação irregular, isto é, desvio de água, no português claro, roubo de água. E não dá para separar o que é desvio do que é vazamento, e tudo entra no mesmo pacote.

É claro que não dá para depender somente da bondade da natureza – vide Israel –, mas dizer que não houve investimento é ignorância!, houve, sim, muito desmatamento e crescimento desordenado, isto é, a prefeitura, diariamente, libera “habite-se” para enormes condomínios com suas enormes caixas d’água, e a Sabesp que se vire para ceder água para todos; há invasão todos os dias pela cidade, e a Sabesp que se vire em fornecer água. Mesmo para o Estado mais rico do país fica difícil dar conta do exacerbado crescimento demográfico. Quem discorda, nunca leu Thomas Malthus, primeiro professor de economia da história.

E por que o governo nunca limpou o Rio Tietê? Pois bem, esse era o grande projeto do então governador, entre 2007 e 2010, José Serra. Mas, como deve ser sabido, é um projeto muito caro e complexo, que envolve, inclusive, muitos municípios do Estado, pois o rio tem nascente em Salesópolis. E para que o projeto dê certo, é preciso contar com a colaboração de todos os prefeitos e suas empresas de serviços públicos na área hídrica e de saneamento, pois é preciso despoluir inúmeros córregos que desembocam no rio. Assim, o governador de SP, na época, encontrou um entrave no município de Guarulhos (comandado pelo PT há mais de uma década, e, diga-se de passagem, com abastecimento de água municipalizado, e não da Sabesp). Guarulhos, portanto, não aceitou ceder a um projeto de um oponente político. Então, por conta de um crápula chamado Elói Pietá, o projeto não pôde continuar. E mesmo se o Rio Tietê estivesse límpido como todos gostariam, seria muito difícil mantê-lo assim devido a tantas invasões de terra nas beiras de córregos e a tanta falta de bom senso das pessoas, que ainda não aprenderam que não se suja vias públicas.

Por que então o governador eleito, Geraldo Alckmin, falou que não haveria racionamento, e hoje possui outro discurso? Qualquer ser de bom senso evita o racionamento ao máximo, e não é por conta de criar eleitores inimigos, mas porque o racionamento cria diversos problemas. Um deles é que as pessoas, nessas situações, costumam estocar água, e assim se gasta muito mais; outro fator é que racionamento prejudica as tubulações, pela intermitência de passagem de água. Racionamento é só mesmo em último caso. Antes da eleição, o candidato à reeleição afirmou que até abril de 2015 haveria água, e a partir de então, as medidas que seriam tomadas poderiam variar dependendo da situação em que estivesse. Portanto, não houve mentiras na campanha.

Há mais de um ano, a Sabesp tem pedido que as pessoas economizem água, e tanto ela como o governador nunca negaram problemas nesse campo. Diferentemente do que fez nossa presidente com a energia elétrica. Para quem não lembra, há mais ou menos dois anos, ela deu um desconto irresponsável de aproximadamente 20% nas contas de luz, e isso arruinou as contas públicas. Com essa atitude, ela incentivou as pessoas a gastarem energia em demasia, pois como ela afirmava, com ela na presidência não haveria problema. Vide hoje o estado do país no campo hídrico e elétrico. Já se fala em racionamento de energia, pois as represas no âmbito federal não possuem água para fazer funcionar as hidrelétricas. E as contas de luz, que baixaram demagogicamente na época, hoje estão subindo o dobro do desconto dado há dois anos.

Portanto, quando leio críticas e mais críticas destinadas somente a Geraldo Alckmin, compreendo que a ignorância e racionalidade restrita do ser humano não têm limite.