terça-feira, 17 de novembro de 2020

Política se faz no dia a dia

 

A partir de 2013, com as bombásticas manifestações que ocorreram país afora, as pessoas, especialmente os jovens, passaram a ser mais presentes no campo da política, e isso tem o lado bom e o lado negativo, como já afirmei em artigo passado. O lado bom resta evidente: a participação num assunto de interesse coletivo. O lado negativo, por outro lado, é que as coisas foram atropeladas. As pessoas, de um modo geral, que nunca tiveram interesse nesse tipo de assunto, ascenderam nele repentinamente, e raivosas. O “repentinamente” é ruim pelo fato de as pessoas terem embarcado numa onda massiva, sem com isso entenderem muito daquilo que replicavam, e o “raivosas” é ruim pelo fato de que política é a arte do diálogo, com prudência e com discernimento.

Se perguntarmos por aí o que é realmente direita e esquerda, certamente poucos saberão; se perguntarmos por aí o que é, de fato, fascismo, comunismo e nazismo, certamente poucos saberão; se perguntarmos por aí as diferenças objetivas entre os variados sistemas políticos existentes, certamente poucos saberão; se perguntarmos por aí a diferença entre sistema econômico liberal e conservador, certamente poucos saberão; se perguntarmos por aí a diferença entre socialismo utópico e socialismo científico, certamente poucos saberão. E são essas pessoas que estão nas redes sociais vociferando e dando discursos. É claro que todos têm o direito de se expressar, e o tema da política não é exclusividade de quem estuda, mas o cidadão faria muito bem conhecer sobre o tema que aborda.

Mas o pior de tudo não é isso, e agora chego ao ponto que gostaria. Política se faz no dia a dia, no corpo a corpo, no contato, na empatia, na prática cidadã, na luta..., política não deveria ser feita atrás de escudos, como celulares e computadores. Essa prática no dia a dia, sim, está ao alcance de todos, conhecendo ou não os conceitos políticos que mencionei acima. E quando me refiro às práticas do cotidiano, não me refiro a sair levantando bandeiras de partidos políticos pelas ruas ou gritando palavras de ordem. Para participar do bom funcionamento da coisa pública não é necessário subir em palanques partidários. Aquelas pessoas que estão no dia a dia dos trabalhos em prol de sua comunidade (e aqui utilizo o termo “comunidade” de forma ampla, e não como sinônimo de periferia, como erroneamente se faz por aí) fazem política; aquelas pessoas que fazem algum trabalho voluntário em alguma ONG fazem política; aquelas pessoas que dedicam algum tempo de sua vida a fazer algum trabalho social fazem política; aquelas pessoas que não aceitam práticas anticidadãs no dia a dia fazem política.

Já pensei eu, no passado, que ser um contribuinte como cidadão trabalhador era suficiente, e que já estaria fazendo, portanto, minha parte, uma vez que através desses impostos o governo promove a contrapartida aos munícipes. Mas eu estava errado. Pagar impostos corretamente não basta. É preciso lutar pelas melhorias públicas, estar a par e ser parte do andar da carruagem das decisões políticas que nos envolve, sejam elas na Câmara Municipal, na Assembleia Legislativa, no Congresso Nacional ou mesmo na direção do posto de saúde de seu bairro ou na escolha de conselhos gestores diversos.

Você, leitor, sabe ao menos o nome do subprefeito da região onde está seu distrito? Sabe o que é distrito? Sabe o nome do diretor da UBS de seu bairro? Já fez algo por sua comunidade? Já fez algo pelo próximo, sem ser dar esmola no farol, o que só aumenta a miséria? (Quem afirma sobre o aumento da miséria não sou eu, mas, entre outros, Malthus, Keynes e Dostoiévski.)

Pois bem, comece por aí. Faça política de verdade! Gritar na frente do computador é muito cômodo e não contribui em nada para a melhoria de seu bairro, menos ainda de seu distrito, menos ainda de seu município, menos ainda de seu Estado e muito menos de seu país. É fácil fazer propaganda de candidato A ou B e entrar em brigas e fazer inimizades, é fácil bater no peito e menosprezar a opinião alheia, mas no fim tudo isso não passa de promoção pessoal e de uma tentativa de se autoconvencer de que se está fazendo algo de bom. Não está!

terça-feira, 10 de novembro de 2020

A saúde pública municipal

 

Aqueles que não possuem convênio médico, e que, portanto, estão nas mãos do serviço público de saúde, precisam ficar atentos a alguns pontos. (Num próximo artigo posso dissertar um pouco sobre o mal que os convênios exercem sobre o SUS, com o aval, infelizmente, do próprio governo, e como os convênios são usados para furar filas de quem depende do serviço público.)

Pois bem, são dois pontos que quero ponderar, deixando claro de antemão, porém, a importância do SUS em nosso país:

1- A saúde pública municipal (e aqui me atento ao município pelo fato de estarmos diante de eleições municipais) é privatizada. Então de quem é a culpa do mau funcionamento do serviço público? Do governo ou do setor privado? Muitos candidatos, que se dizem liberais (talvez sem nunca na vida terem lido Keynes) difamam o Estado e exaltam a iniciativa privada, sem se dar conta de que esta já está incrustada na vida do cidadão. Essas entidades privadas não constroem nada em benefício do cidadão, elas pegam tudo pronto. Isto é, o governo cria, e as tais entidades apenas chegam e sentam na janela para administrar o que já está pronto, muito porcamente, diga-se de passagem. Não sou contra qualquer iniciativa privada, veja bem. Empresa é criada para ter lucro, apesar de nesse caso ser sobras, e não lucros, já que essas entidades teoricamente não possuem fins lucrativos. O que eu critico aqui então é a mistura público-privada, refiro-me aqui às associações de direito privado e ao governo que permite essa mistura deletéria.

Jamais deveria ser permitido misturar público e privado, e os governos comentem um erro fatal ao entregar um serviço que deveria ser de sua única incumbência a entidades privadas que parecem somente almejar ganhos – apesar de, repito, teoricamente serem sem fins lucrativos – em cima da vida do mais vulnerável. O governo com isso lava as mãos e assina sua própria incompetência administrativa. O candidato que entrou lá, entrou para administrar, mas ao invés de cumprir seu papel de administrador, terceiriza sua função. Nesse caso, ambos, o público e o privado, são culpados, portanto! Sem contar que o serviço privatizado sai muito mais caro para o bolso do contribuinte do que se fosse apenas público, apesar de alguns políticos – que provavelmente faltaram nas aulas de matemática do ensino básico – dizerem ser mais barato. Não é!

Todo candidato da oposição desses supostos liberais, por outro lado, sempre critica a entrega dos equipamentos públicos à mão dessas associações que nada constroem, mas, de outro modo, quando eventualmente assumem um mandato, nenhum deles extirpa essas OSs (organizações sociais) de vez do serviço público. É como criticar a reeleição, mas se valer dela ao estar no cargo. Hipocrisia! Percebe, leitor, como está tudo errado, tanto o modus operandi do serviço público, como os candidatos das mais variadas vertentes em sua exagerada demagogia eleitoral?

 2- Para se conseguir um agendamento com um médico no serviço público (que na verdade é privado), a pessoa leva um tempo que às vezes ela não tem. Veja o processo:

Se for com um especialista, ela não pode agendar diretamente com ele, mas precisa conseguir antes passar com um clínico geral. Para isso, essa pessoa precisa ir até uma UBS tentar o agendamento com o tal clínico, ao chegar lá, muito possivelmente ouvirá que a agenda dos clínicos já está preenchida, e que, portanto, ela precisa aguardar até a próxima abertura, que geralmente acontece uma vez por mês. A pessoa então tem de retornar à UBS na data sugerida, mas precisa chegar o mais cedo possível, uma vez que a agenda é preenchida em poucas horas, e depois só no mês seguinte de novo. (Claro que sempre é possível entrar na fila de espera de desistência, mas veja a humilhação.)  

Pois bem, se a pessoa der sorte e conseguir uma data com o clínico geral, não será para tão breve. Então no dia da consulta ela vai até o posto de saúde e passa com o médico, que aí sim lhe dará um encaminhamento (uma espécie de aval) para o tal especialista. O paciente então, com o encaminhamento em mãos, vai até uma sala apresentá-lo a uma pessoa responsável, que verá se há ou não vaga em alguma unidade de saúde da cidade (isto se não a mandarem diretamente até uma dessas unidades tentar a sorte diretamente). Se, porventura, e com sorte, houver uma vaga disponível, muito raramente será próximo de sua casa e numa data próxima.

Chegou o dia da consulta, o paciente vai até a unidade de saúde para sua consulta. O especialista possivelmente vai pedir um exame. O paciente pega o pedido, vai até a recepção e lá tenta a sorte de ter uma vaga para fazer o tal exame. Muito provavelmente não será perto de sua casa, nem para tão já. No dia do exame, ele o faz, mas o resultado só pegará dali a alguns bons dias. Com o resultado em mãos, enfim, ele precisa ainda marcar retorno com o especialista para que este o analise. Dali em diante pode ser tudo muito relativo.

Caro leitor, acompanhou a saga e a humilhação do paciente?

Para finalizar, eu deixo alguns pontos para análise, sem quaisquer acusações.  

1- No convênio médico, a pessoa consegue marcar consulta com um especialista com apenas um clique, possivelmente para o dia seguinte e bem próximo de sua casa. A vida é muito mais fácil, portanto. Questão: há alguém do setor privado incrustado no governo e boicotando o serviço público para obrigar as pessoas a assinarem com um convênio médico? A mesma pergunta serve para o setor da educação. E aqui todo mundo sabe a força do lobby.

2- As associações que assumem a tal terceirização pública dão um atendimento humilhante às pessoas de propósito para obrigá-las a procurar um serviço privado? Muitas vezes no consultório particular dos próprios médicos?

3- Os políticos, pessoal ou partidariamente, que entregam as pessoas na mão dessas entidades têm contrapartida dos responsáveis por elas?

4- Por que alguém iria querer pegar uma UBS para administrar, sabendo a encrenca que é lidar com saúde pública? Qual é o acordo sedutor feito entre as associações e o governo?

5- Quais são os termos obscuros nesses editais? Ou será só um aperto de mão?

6- Por que a saúde pública e seu atendimento nunca têm uma melhora significativa?

Se você notar, caro leitor, em todo debate de eleição municipal, a saúde é um assunto importante, e todos eles, de todas as vertentes ideológicas, acusam o oponente pelos maus serviços e prometem melhorar a saúde pública, das mais variadas formas possíveis. Um diz que vai tornar os postos de saúde 24 horas, o outro diz que vai zerar a fila de exame, o outro vai ampliar ou encerrar a parceria com o setor privado etc. Mas o ponto é que nunca nada avança substancialmente, e cada um deles quando precisa de um médico vai a hospitais privados caros, que, diga-se de passagem, também têm acordos grandes com o governo. Possivelmente, nenhum desses agentes públicos conhece a saúde pública de fato, e devem rir de nossa cara em seus domingos de sol na piscina de seus seguros condomínios.

E agora vem a pergunta final.

Quem é mais canalha nessa história toda?

 

Política partidária versus arte na rede

 

A rede social no Brasil existe há quase vinte anos, mas foi a partir de 2013 que o assunto política invadiu os “sites” de relacionamento massivamente. Naquele ano houve estrondosos protestos espalhados pelo país com variadas reivindicações, apesar de o estopim ter sido o aumento nas passagens de ônibus em diversos municípios. De repente estavam sobre a laje do Congresso Nacional. Até hoje muita gente não entende o que os grupos que saíram às ruas queriam de fato, inclusive eu. O ponto é que repentinamente a maior parte das pessoas, que até então se ocupava com tudo menos com política partidária, passou a debater temas político-sociais. Isso não é de todo ruim – caso a pessoa se debruce na matéria, obviamente, coisa que claramente não vimos –, o ruim é o meio e a forma com que as pessoas passaram a discutir o assunto: com o estômago e sob o escudo das redes sociais, isto é, as piores combinações possíveis. Sem mencionar o fato, ainda, de que ninguém desses que todos defendem nessas redes foi beneficiado em algum momento. São brigas que têm o fim em si mesmas, portanto.   

Não são tempos fáceis, apesar de já ter havido piores. Ninguém ainda parece ter dominado de fato o uso dos mecanismos tecnológicos digitais de massa, especialmente quando se trata de relacionamento. As informações são instantâneas e as pessoas estão conectadas entre si o tempo todo. Segundo o “site” O Globo (2019), o Brasil é o segundo país que mais passa tempo nas redes sociais, e isso não é bom. Se pelo menos não houver discernimento, as brigas por assuntos quaisquer serão mesmo certas e infindáveis. Se há algo que pudemos aprender nos últimos sete anos, a política (e aqui falo de modo geral) não é saudável se feita através da internet. Talvez possa ser um dia, mas ainda não temos essa capacidade. Ela só faz criar inimizades, intrigas, debates supérfluos e de baixo nível e discussões que não saem dali. A política se faz no dia a dia, na luta pelo próximo, no corpo a corpo da rotina do mundo, e não vociferando atrás de monitores. Não quero aqui coibir as pessoas de se expressarem, mas debater sobre o que não se sabe direito ou sobre o que aprendeu superficialmente lendo blogs ou afins não tem outro resultado senão motins descabidos.

E eu então pergunto: por que não usar esse tempo todo que se passa nas redes sociais para fazer amizades saudáveis, compartilhar materiais sadios e complementar o bom conhecimento? Apesar da crise educacional, e consequentemente cultural, pela qual passamos, bons artistas surgem quase o tempo todo, mas perdem espaço naquilo que seria o melhor meio de divulgação de sua arte: a rede social. E perdem espaço para as incontáveis baboseiras que contaminam a internet.

Com tudo isso, o que é mais salutar compartilhar nas redes: arte ou política?

P.S. Você que vive brigando pelo próximo nas redes sociais, já fez algo pelo próximo além do monitor? Você é importante para sua comunidade? Quem é o subprefeito de seu distrito?