domingo, 7 de maio de 2017

Amor: O Encosto dos Fracos

O amor sempre esteve associado à patologia, e, claramente, isto não mudou desde os tempos medievais, fase em que a literatura mais se ateve a estes assuntos. (Refiro-me aqui à relação conjugal.). Pathos: paixão, passagem, passividade, sofrimento.

Somos dependentes de outrem. No amor, as pessoas funcionam numa espécie de encantamento que tira o agente de si. Caso o amor não seja correspondido, o mundo acaba; por outro lado, se for, a dependência tende a aumentar, e seu mundo acaba da mesma maneira, visto que ele, seu mundo, torna-se o mundo do outro.

O mundo contemporâneo, através da genialidade de antepassados (e, claro, dos gênios também de nossas gerações, que poderão também ser chamados, num futuro, de “gênios de nossos antepassados”), proporcionou-nos uma vida mais prática, em comparação à vida de gerações passadas, entretanto, o que fizeram esses gênios se não destruir nosso mundo, à medida que esta praticidade nos fez mimados e carentes?

Na medida em que a média de vida humana aumenta (e está aí mais uma das genialidades humanas, mexer na própria mortalidade, ao passo que se consegue retardá-la), as pessoas não sabem o que fazer com tanto tempo, e destroem-se, e destroem-se umas às outras. É o ônus do ócio em demasia.

Fomos os escolhidos, à força do acaso, para viver a transição para esta realidade frenética. Ela mal começou, e já é possível notar as mentes cansadas, e querendo uma vida mais simples, como a dos antepassados, estes que nos deram (pensando que faziam o bem) esta vida insuportável.

As pessoas buscam uma vida mais singela, com menos vícios. A alimentação menos escravatória, o sedentarismo aos poucos sendo deixado de lado, bebidas e cigarros em menor intensidade... e o amor vivido em sua amplidão. Percebe, leitor?, a contradição que há nisso tudo? O maior dos vícios é superestimado, enquanto os demais são rechaçados.

Eu entendo, sim, que aquele que fala mal do amor é porque não passa de um fraco que se desiludiu em alguma medida. Contudo, a ilusão de uma vida perfeita, que é a busca da maioria, faz com que vivamos esta desilusão sem nos darmos conta de que ela nos acompanha no dia a dia. É a covardia vencendo a coragem às suas (suas, leitor) custas.

Veja que coisa linda. Uma moradia sendo paga em duzentos anos, com três filhos gritando pela casa e humilhando seus pais através de seus mimos, seis horas de trânsito num fim de semana para aproveitar uma praia lotada e fugir de uma realidade enquanto vive outra ainda pior...

A fuga de uma realidade X é a prova de que a vida que se foi escolhida não valeu a pena, e assim vamos nós fugindo das realidades que vamos escolhendo e vivendo.

Nossos avós, em termos gerais, viveram "felizes para sempre" porque não faziam parte de uma geração carente e mimada, ao menos não com a intensidade que vive nossa geração. (Falo, ainda, sobre relações conjugais. É óbvio que a qualidade de vida, segundo penso, melhorou através das gerações.)

"No fim valeu a pena?", perguntarão os apaixonados, num futuro. Suas respostas, se tomadas pelo devaneio e escravidão do amor, o que é bem provável, serão suspeitas.

Não escrevi este artigo, caro leitor, sugerindo que vivamos sozinhos para sempre, mas enquanto esta nova cultura do individualismo e carência em excesso não retroceder, o amor será apenas um encosto para os fracos.

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