quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Tu és Colaborador! - A Revoltosa Centrífuga

Resta evidente que o padrão de vida, de uma forma geral, melhorou nos últimos séculos. Não vou, entretanto, aprofundar-me neste sentido, já que este não é o foco do artigo. Fiz, no entanto, este introito a fim de clarificar que, apesar de muitos malefícios, não testaram ainda um sistema mais eficaz para esta melhora que a própria economia de mercado, lembrando que ela é um avanço dos gradativos sistemas posteriores ao escravismo: feudalismo, mercantilismo e, por fim, a própria economia de mercado.

É lastimável, por outro lado, que alguns empresários sintam-se pressionados a ter de enganar seu consumidor para conseguir respeito, já que uma parte efervescente e barulhenta se opõe, por questões doutrinárias, ao lucro. Pensa ela que ainda vivemos sob as leis do século XIX. (É claro que às vezes este embuste é por má-fé.)

Explico sobre o engodo mencionado acima. Presenciamos propagandas de marcas de produtos diversos associando a felicidade, a família, o meio-ambiente..., à mercadoria. Quando o fazem como meio de alcançar o consumidor, compreendido, mas muitos o fazem para não atingir uma sociedade politicamente correta, que finge repudiar o dinheiro e os bens materiais, além de pensar que empresário não pode visar lucro. Naturalmente e em contrapartida, essa postura receosa desses empresários covardes contribui para que esta situação fique acomodada. Certamente, outro avanço que nossa sociedade vem alcançando nas últimas décadas é a conscientização de um mundo melhor e mais saudável. Mas o ponto aqui é a hipocrisia do agrado. Empresa é criada para dar lucro. É desta forma que ela contribui com o país no qual está instaurada. Há órgãos competentes para cumprir o papel social de uma nação.

As empresas não enganam somente seus consumidores, mas também seus empregados, começando, por exemplo, por chamarem-nos de colaboradores. É claro que isso pode ser apenas uma questão de semântica. Assim como se trocou “empregado” por “funcionário”, hoje se troca “funcionário” por “colaborador”. Quando virem que o tal colaborador é um mero empregado, trocarão “colaborador” pela palavra politicamente correta do futuro, quem sabe “adjunto”. Ninguém saberá o que é, e por isso será tão bem aceita, assim como as pessoas não têm total consciência acerca do significado de "colaborador". Devo deixar claro que muitas vezes também se troca “empregado” por “funcionário” por pura confusão e desconhecimento. Funcionário é servidor público, no mundo privado, o contratado é um empregado.

A Administração nos diz que o empregado é contratado para cumprir suas funções e atributos. O colaborador, por outro lado, vai além, ele é comprometido com a empresa de modo geral, auxilia, ajuda seus companheiros, busca melhorar e blá-blá-blá. Obviamente só o faz para manter seu emprego. Desta maneira, o "colaborador" finge colaborar e a empresa finge que ele não é um mero empregado. Todos ficam felizes perante o outro e ninguém se mata no meio do expediente. Parabéns ao paliativo! Particularmente, eu prefiro manter-me visceral à base de Rivotril. Os empresários se esquecem, ainda, que não é somente o empregado quem deve seus préstimos por ter um emprego, mas eles também o devem a seus contratados por tê-los ali dedicados; é uma relação recíproca, mas em nossa dura realidade só se assiste empregados que tremem frente ao patrão, como se este fosse seu senhor. Não há um respeito natural, mas apenas poder hierárquico.

Tudo isso pode, contudo, fazer parte de uma roda ainda maior. Isto é, empregado feliz produz mais e melhor; empregado feliz é um bom consumidor, e o sistema – a revoltosa centrífuga – no qual estamos se alimenta desse consumo.

O que geralmente não se é lembrado é que o empresário também é um consumidor, também está inserido neste sistema enganoso e hipócrita, também está nas mãos de outros empresários. Ele engana e é enganado pelas mesmas armas que utiliza, a maior parte das vezes sem saber, e quem vence é o sistema, talvez o cosmos. Sim, o cosmos vence à medida que um empregado feliz vê sentido em sua vida quando chega a casa e liga seu Netflix, percebendo, deste modo, sua vida fazer sentido. Imagine você sete bilhões de pessoas imaginando a vida sem sentido, como eu? Qual seria o resultado de tanta insatisfação e ceticismo simultâneos?

É lastimável notar como as coisas devem ser simplesmente para as pessoas não neutralizarem o andamento do mundo. Um pisa sobre a cabeça do outro e ainda assim a gente vive melhor, ou ao menos acredita que vive em circunstância de outro engodo megalomaníaco: nosso inconsciente. E não se engane, o ser humano é como os pombos. A gente se comove com aquele que está tomando bicada de seus pares e perdendo a disputa pelo alimento, mas quando aquele prejudicado toma a frente, não titubeia, e faz o mesmo com os que ficaram para trás.

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