Aqueles
que não possuem convênio médico, e que, portanto, estão nas mãos do serviço público
de saúde, precisam ficar atentos a alguns pontos. (Num próximo artigo posso
dissertar um pouco sobre o mal que os convênios exercem sobre o SUS, com o
aval, infelizmente, do próprio governo, e como os convênios são usados para
furar filas de quem depende do serviço público.)
Pois
bem, são dois pontos que quero ponderar, deixando claro de antemão, porém, a
importância do SUS em nosso país:
1-
A saúde pública municipal (e aqui me atento ao município pelo fato de estarmos
diante de eleições municipais) é privatizada. Então de quem é a culpa do mau
funcionamento do serviço público? Do governo ou do setor privado? Muitos
candidatos, que se dizem liberais (talvez sem nunca na vida terem lido Keynes) difamam
o Estado e exaltam a iniciativa privada, sem se dar conta de que esta já está
incrustada na vida do cidadão. Essas entidades privadas não constroem nada em
benefício do cidadão, elas pegam tudo pronto. Isto é, o governo cria, e as tais
entidades apenas chegam e sentam na janela para administrar o que já está
pronto, muito porcamente, diga-se de passagem. Não sou contra qualquer
iniciativa privada, veja bem. Empresa é criada para ter lucro, apesar de nesse caso ser sobras, e não lucros, já que essas entidades teoricamente não possuem fins lucrativos. O que eu critico
aqui então é a mistura público-privada, refiro-me aqui às associações de direito
privado e ao governo que permite essa mistura deletéria.
Jamais
deveria ser permitido misturar público e privado, e os governos comentem um
erro fatal ao entregar um serviço que deveria ser de sua única incumbência a entidades
privadas que parecem somente almejar ganhos – apesar de, repito, teoricamente serem sem
fins lucrativos – em cima da vida do mais vulnerável. O governo com isso lava
as mãos e assina sua própria incompetência administrativa. O candidato que
entrou lá, entrou para administrar, mas ao invés de cumprir seu papel de
administrador, terceiriza sua função. Nesse caso, ambos, o público e o privado,
são culpados, portanto! Sem contar que o serviço privatizado sai muito mais
caro para o bolso do contribuinte do que se fosse apenas público, apesar de
alguns políticos – que provavelmente faltaram nas aulas de matemática do ensino
básico – dizerem ser mais barato. Não é!
Todo
candidato da oposição desses supostos liberais, por outro lado, sempre critica
a entrega dos equipamentos públicos à mão dessas associações que nada
constroem, mas, de outro modo, quando eventualmente assumem um mandato, nenhum
deles extirpa essas OSs (organizações sociais) de vez do serviço público. É
como criticar a reeleição, mas se valer dela ao estar no cargo. Hipocrisia!
Percebe, leitor, como está tudo errado, tanto o modus operandi do serviço público, como os candidatos das mais
variadas vertentes em sua exagerada demagogia eleitoral?
Se
for com um especialista, ela não pode agendar diretamente com ele, mas precisa
conseguir antes passar com um clínico geral. Para isso, essa pessoa precisa ir
até uma UBS tentar o agendamento com o tal clínico, ao chegar lá, muito
possivelmente ouvirá que a agenda dos clínicos já está preenchida, e que,
portanto, ela precisa aguardar até a próxima abertura, que geralmente acontece uma
vez por mês. A pessoa então tem de retornar à UBS na data sugerida, mas precisa
chegar o mais cedo possível, uma vez que a agenda é preenchida em poucas horas,
e depois só no mês seguinte de novo. (Claro que sempre é possível entrar na
fila de espera de desistência, mas veja a humilhação.)
Pois
bem, se a pessoa der sorte e conseguir uma data com o clínico geral, não será
para tão breve. Então no dia da consulta ela vai até o posto de saúde e passa
com o médico, que aí sim lhe dará um encaminhamento (uma espécie de aval) para
o tal especialista. O paciente então, com o encaminhamento em mãos, vai até uma
sala apresentá-lo a uma pessoa responsável, que verá se há ou não vaga em
alguma unidade de saúde da cidade (isto se não a mandarem diretamente até uma
dessas unidades tentar a sorte diretamente). Se, porventura, e com sorte,
houver uma vaga disponível, muito raramente será próximo de sua casa e numa
data próxima.
Chegou
o dia da consulta, o paciente vai até a unidade de saúde para sua consulta. O
especialista possivelmente vai pedir um exame. O paciente pega o pedido, vai
até a recepção e lá tenta a sorte de ter uma vaga para fazer o tal exame. Muito
provavelmente não será perto de sua casa, nem para tão já. No dia do exame, ele
o faz, mas o resultado só pegará dali a alguns bons dias. Com o resultado em
mãos, enfim, ele precisa ainda marcar retorno com o especialista para que este
o analise. Dali em diante pode ser tudo muito relativo.
Caro
leitor, acompanhou a saga e a humilhação do paciente?
Para
finalizar, eu deixo alguns pontos para análise, sem quaisquer acusações.
1-
No convênio médico, a pessoa consegue marcar consulta com um especialista com
apenas um clique, possivelmente para o dia seguinte e bem próximo de sua casa.
A vida é muito mais fácil, portanto. Questão: há alguém do setor privado
incrustado no governo e boicotando o serviço público para obrigar as pessoas a
assinarem com um convênio médico? A mesma pergunta serve para o setor da
educação. E aqui todo mundo sabe a força do lobby.
2-
As associações que assumem a tal terceirização pública dão um atendimento
humilhante às pessoas de propósito para obrigá-las a procurar um serviço
privado? Muitas vezes no consultório particular dos próprios médicos?
3-
Os políticos, pessoal ou partidariamente, que entregam as pessoas na mão dessas
entidades têm contrapartida dos responsáveis por elas?
4-
Por que alguém iria querer pegar uma UBS para administrar, sabendo a encrenca
que é lidar com saúde pública? Qual é o acordo sedutor feito entre as associações
e o governo?
5-
Quais são os termos obscuros nesses editais? Ou será só um aperto de mão?
6-
Por que a saúde pública e seu atendimento nunca têm uma melhora significativa?
Se
você notar, caro leitor, em todo debate de eleição municipal, a saúde é um
assunto importante, e todos eles, de todas as vertentes ideológicas, acusam o
oponente pelos maus serviços e prometem melhorar a saúde pública, das mais
variadas formas possíveis. Um diz que vai tornar os postos de saúde 24 horas, o
outro diz que vai zerar a fila de exame, o outro vai ampliar ou encerrar a parceria com o
setor privado etc. Mas o ponto é que nunca nada avança substancialmente, e cada um deles quando
precisa de um médico vai a hospitais privados caros, que, diga-se de passagem,
também têm acordos grandes com o governo. Possivelmente, nenhum desses agentes
públicos conhece a saúde pública de fato, e devem rir de nossa cara em seus
domingos de sol na piscina de seus seguros condomínios.
E
agora vem a pergunta final.
Quem
é mais canalha nessa história toda?
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